segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Vida de La Pinto


A televisão sempre foi a sua grande paixão. Não que tenha relegado às calendas outras formas de entretimento. Numa determinada fase da sua vida só saia de casa após assistir as três novelas. E não tinha argumento que a demovesse dessa caturrice. Cedia apenas diante da possibilidade de ter TV onde estava sendo convidada, pois sabia que estavam tirando o seu chão dos seus pés.
Rotineiros eram os embates acalorados quando alguém perguntava alguma coisa sobre o enredo ou se fizesse qualquer comentário sobre o ator e a atriz. Quem mais sofria era a Leda Maria, goiana, que vinha encontrá-la no verão. Totalmente alheia as tramas e doida por um dedo de prosa, danava a perguntar.
- Quieta, Leda, respondia la Pinto.
Com a diversificação da programação das TVs, principalmente com as transmissões esportivas, passou a dividir seu ardor televisivo. Foi também uma forma de reviver seu passado de atleta, na seleção capixaba de vôlei. Aos domingos, com programação de três ou mais eventos esportivos, o Walmir Fiorotti, outro amigo, criou o domingão de la Pinto.
A sua aposentadoria trouxe outra forma de brincadeira: Vida de la Pinto. É que sobrou mais tempo e comprou outro aparelho pra sua sala de estar, solução encontrada pra assistir simultaneamente novelas e eventos esportivos, após instalar a TV a cabo. E dava conta do recado. Inclusive, adquiriu um novo hobby, as lutas livres das madrugadas, mantido livre do sono, exercitando o seu karate boliviano.
Hoje, Ângela Pinto, grande figura, amiga e companheira, dos tempos de Vitória, capital capixaba, não abandonou a TV, mas já não tem o mesmo fervor de outrora pelas três novelas, embora ainda seja incapaz de ficar 24 horas sem olhar pra telinha.


sexta-feira, 28 de agosto de 2009

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Os injustiçados


Quebra o meu galho; a vaca foi pro brejo; isso é um abacaxi; e, não gosto de jiló, amargo já basta a vida.
Com certeza, caso já tenha algum entendimento da vida, já ouviu alguma dessas expressões. Graças ao acelerado processo de urbanização já não pontua com mais frequência nas conversas como antanho. Deve ser porque saímos do campo e entramos pela evolução tecnológica, com outros usos e costumes nesses novos tempos. Mas não desapareceram para alguns imperdenidos.
Quebra o meu galho é do tempo das florestas cobrindo a terra e o homem achando que o recurso era infinito. Não é mais ecologicamente correta, além de carregar a pecha de tráfico de influência.
Duas injustiças acontecem com a vaca foi pro brejo. Ora, criatura, vaca cria bezerro/a, produz leite e carne, etc. Brejo não é um lugar ruim. Lá tem é muita vida!
Faço aqui uma mea culpa com os brejos. Nos anos 70/80, o governo capixaba lançou os programas Provárzea/Provales, de drenagem dessas áreas, uma panacéia pra auto-suficiência na produção de alimentos. Na prática mostrou-se um desastre, secando vários locais e dizimando centenas de espécies, algumas desconhecidas. Ajudei a divulgar essa falácia.
Leia Isso é um abacaxi no post abaixo.
Não gosto de jiló, amargo já basta a vida, pauta deste post, sugestão do Dino. O solanum gilo, que também é fruto, graças as mutações genéticas não é o mesmo que comia na infância, colhido na horta próxima de casa. Virou transgênico, mudou a cor, tamanho, agora com sabor insosso, desenxabido, contrapondo as agruras da vida moderna.
Desafio aceito, caro Dino, mas ao invés da Rainha, como propôs, vamos de Mulher Jiló, seguindo a tendências "das frutas".
O requisito básico é o jiló transgênico aí de cima.

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Abacaxi é fruto


Ao contrário de algumas referências tentando impingir ao abacaxi uma certa má reputação - isso é um abacaxi, peguei um abacaxi, etc. e tal -, a aldeia faz questão de referenciar esse fruto, inclusive realizando festa pra comemorar o início da sua colheita.
Ele é uma importante atividade econômica pra centena de famílias, cerca de 3,8 mil pessoas, e para a aldeia. Marataízes responde por 70% da produção do Espírito Santo, estimada em 50 mil toneladas do fruto, dando ao município a primazia de um dos principais centro produtor de abacaxi do país.
A colheita, que inicia agora e se estende até janeiro e fevereiro, quando é farta e tem boa cotação no mercado, os reflexos aparecem.
Os vendedores já começaram a abastecer seus pontos de vendas às margens da rodovia, aumentando a oferta com a chegada do PSP - Povo Sem Praia - pra salgar a bifa.
A 8ª edição da Festa do Abacaxi vai de 21 a 23 próximo na comunidade de Brejo dos Patos. Além de apresentações musical tem a eleição da "Rainha do Abacaxi" e também premiação aos produtores de abacaxis.
Brava, gente, que vai descascando o preconceito contra o abacaxi.

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Bravo Tromba!!!!!!!


Os campos de futebol no Brasil estão cheios de jogadores negros. Não tenho estatística pra explicitar minha elucubração, mas é só olhar pra os times que identificamos essa supremacia. Eles são os caras tocando a pelota. Pertenço há este tempo, embora eles estejam hoje mais pra lascar a canela ou maltratar a redondinha.
Essa realidade não se reproduz com os "professores", aquela figura da beira das quatro linhas a esbravejar ordens, cunhadas de "teorias futebolísticas", atrás de vitórias que garantam seus empregos.
Por mais paradoxal que a situação se mostre, ela não deixa de refletir a injusta escala na ascensão social da hierarquia na sociedade brasileira. Diria até ser um quadro caricato, pura ironia com o nosso futebol, que move montanhas e multidões, justamente ele que é visto com a porta de entrada na escala social.
Dos vinte times que hoje disputam a primeira divisão do Campeonato Brasileiro, até bem poucos dias não tinha um técnico negro. Talvez dois ou três com características negras, detalhes que fazem parte da grande massa.
Por isso a efetivação do Andrade, o Tromba, no comando do Flamengo, é uma novidade. Cinco vezes campeão brasileiro, torço pra que ele repita o que sempre realizou dentro dos campos, com técnica e sabedoria, que foi jogar bola.
Não espero do Andrade o que escreveu José Saramago, no seu ótimo O Caderno de Saramago: "Crie já uma equipa de futebol, uma equipa toda de jogadores monárquicos, treinador monárquico, massagista monárquico, todos monárquicos e, se possível, de sangue azul. Garanto-lhe que se chega a ganhar a liga, o país, este país que tão bem conhecemos se ajoelhará a seus pés."

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Eu tenho Siringomielia VII


TFD

Ao retomar o tratamento da siringomielia, em 2006, no hospital Sarah Kubitschek, Brasília, após 14 anos da confirmação da doença, um prenúncio de dificuldade espreitou-se no horizonte. Como custear as passagens e a estadia na capital federal? É um centro com custo de vida mais caro do planeta. Vivi isso.
O neurologista, Dr. Henrique de Souza, que acompanha meu caso, encarregou de afastar esse temor, indicando o programa de Tratamento Fora de Domicílio - TFD. É recurso Federal, administrado pelas Secretarias Estaduais de Saúde, pra transportes (aéreo ou terrestre) e diárias (20% do salário mínimo), incluindo acompanhante se for preciso. Passei no Serviço Social do hospital pra mais informações, onde peguei o telefone do órgão no Espírito Santo.
Não procurei logo o TFD, acreditando que era uma questão fácil de ser resolvida, deixando pra bem próximo do retorno ao hospital.
Subestimei à "burrocracia".
Os programas públicos precisam de critérios. Isso não se discute. Sem querer ser simplista, mas transparência e preparo das pessoas são requisitos básicos pra qualquer iniciativa.
As dificuldades começaram com o médico do órgão, que ia lá uma vez por semana, apenas por duas horas. Depois de três tentativas, marquei e não fui atendido. O TFD fica em Vitória, capital. Eu moro em Marataízes, a 137 km de distância. Fui atendido na próxima vez porque falei em acionar o Ministério Público, recomendação da assistente social do Sarah.
A tarefa do médico era indicar outro profissional pra fazer a avaliação do meu caso, preencher os formulários, assinar, atestando que a doença precisava de tratamento fora de domicílio.
De frente com o cabra, otorrinolaringologista, explique tudo a ele da siringomielia. Aparentemente sensibilizado me encaminhou ao Centro de Reabilitação Física do Estado - Crefes -, em Vila Velha.
A consulta foi agendada pra daí a 20 dias. Ao entrar na sua sala vi que o médico não era estranho. Com especialidade em fisioterapia, tinha passado por ele no início de 1990, durante a investigação da "mimi". Ele não esperou que concluísse a explicação, pedindo que voltasse ao TFD pra procurar um neurologista. Nem discuti.
De volta, indicaram os Hospitais Evangélico ou das Clínicas, da rede pública, quesito essencial para se ter o benefício.
Coisa simples, não?
Com ajuda da amiga, Terezinha Rangel, marquei com o neurologista do Evangélico, que morava no Rio de Janeiro e atendia duas vezes por mês no hospital. Ele preencheu o relatório, assinou e carimbou sem que fosse preciso entrar no seu consultório. Numa passada de olhos, avaliei que atendia as exigências. Entreguei ao TFD, confiante.
Uma semana depois, liguei atrás da confirmação. Agora "só servia o laudo do hospital das Clínicas" e que também era necessário "preencher o código do tratamento" para enquadramento no SUS.
Foram cerca de quatro meses nessa peregrinação. A data do retorno ao Sarah esgotou-se, mas minha perseverança, não. Ir em frente e derrotar o monstro, agora, era uma obsessão.
Conversei com o Dr. Orlando Abaure que tratava da outra moléstia em busca de ajuda. Ele contatou a titular da cadeira de neurologia da Ufes - Universidade Federal do ES -, a quem pertence o hospital, a Drª Vera Vieira.
Quando estive internado nesse hospital, a notícia que também tinha a "mimi" correu pelos corredores. A Drª. Vera levou duas turmas de estudantes pra conhecer a avis rara, passando pela sessão "martelinho".
Ao entrar na sua sala o circo estava armado. Sentada numa cadeira, atrás da mesa de trabalho, tinha ao seu redor uma dezena de estudantes. Não era hora de fraquejar. A retomada do meu tratamento seria decidida ali. Expliquei o estágio da "mimi", a decisão pelo Sarah e a busca de ajuda no TFD.
Ela, que tem timbre de voz com sonoridade alta, mirou os pupilos e lascou:
- Acha que não podemos fazer ressonância e acompanhar a sua doença.
Gelei. Tive medo.
Recompus as forças, argumentando que o estágio da doença exigia o tratamento num centro de excelência como o Sarah. Pra não admitir a precariedade local, saiu pela tangente, afirmando que " realmente o Sarah é referência em fisioterapia" e que também "estava sensibilizada" com o pedido do "amigo, Dr. Orlando".
Alívio. Aguardei fora e 20 minutos depois o laudo estava nas mãos, entregue por ela, que saiu andando apressadamente quase não dando de agradecer. Agora restava o carimbo e a assinatura de um diretor do hospital além do código. Nada que não se resolvesse. O código, mais difícil, meu "irmão", Walmir Fioroti, que trabalha na Secretaria de Saúde, se encarregou de achar a chave do mistério.
De posse da papelada, a Paula, minha mulher, xerocou e autenticou uma cópia, como segurança,
e fomos protocolar no TFD. Ao analisar a documentação, a funcionária "descobriu" que meu domicílio, Marataízes, estava subordinado ao TFD de Cachoeiro do Itapemirim, Sul do Espírito Santo.
E agora? Pular do sexto andar do órgão, indo direto para o palco do Carlos Gomes, tradicional teatro capixaba, bem ali, ao lado, e representar o bobo da incompetência, da desorganização e da estupidez de parte do serviço público?
A troca foi excelente. Uma recompensa. Encontrei Angela Babinski, responsável pelo órgão, cidadã preparada, sensata, uma colaboradora correta. Final feliz.
Passei a usar benefício naquilo a que se destina.
É o meu compromisso.

terça-feira, 4 de agosto de 2009

Uma condenação


O sempre antenado Blogracio publicou ontem, 03/08/2009, informação da decisão unânime da 2ª turma especializada do TRF da 2ª região - Justiça Federal do Espírito Santo, condenando por crime de racismo contra índios, o "colonista" Gutman Uchôa de Mendonça, do jornal A Gazeta.
Ela veio tarde - como ele tem mais de 70 anos, a pena é um ano de serviço à comunidade - por tudo que despejou contra todos, em quase meio século ininterrupto de serviços prestados à direita capixaba. Grande parte, diariamente, e mais recentemente, três vezes por semana, em espaço nobre do jornal.
É de se penitenciar ainda ser essa sua única condenação, pelo menos a que tenho conhecimento.
Da mesma forma, não espere encontrar essa notícia nos jornalões. Não faz parte do jogo.
Não vai dizer nada, é claro, mas seu espírito deve ser de regozijo com essa pena.
Vou relator dois fatos vividos com ele.
Ao dar os primeiros passos aprendendo o jornalismo - ainda vou aprender - em 1970, na Rua General Osório, centro de Vitória, a "república da Bolívia", onde golpe era rotina na redação, como no país vizinho, Gutman foi profético:
- O bom é você ser de direita.
A julgar pela sua longevidade, os ataques impunes e os cargos que ocupou - só no Sesc foram anos a fio - não exagerou.
O outro é mais recente. No começo de 1990 assessorei o então vice-governador do Estado, Adelson Salvador. Num rompante Quixotesco, em uma de suas interinidades no cargo de Governador, ele tentou peitar a banda podre da política capixaba, hoje, rebatizado de crime organizado, que anda por aí fantasiada de "demo".
Recebi uma informação que Gutman tinha escrito um serviço sujo, questionando a sexualidade do Adelson. Batata. No dia seguinte, o "colonista" tergiversou, disse e não disse, viajou, mas tascou no meio do texto encomendado, publicado em A Gazeta, nessa época, no Caderno Dois, que o codinome do vice-governador nas baladas era "Patrícia".
Talvez o berço de Gutman explique parte da sua personalidade. Ele é de São Mateus, Norte do Espírito Santo, um dos centros do país onde a escravidão foi mais feroz. Lá chegou a existir fazendas de reprodução de escravos, e filhas de escravas foram jogadas em tachos de água fervendo. São relatos do jornalista e historiador, Maciel de Aguiar.
A família de Gutman é casta dessa sociedade rural, que por muito tempo comandou o Estado. Ou seja, típico servidor da Casa Grande.