sexta-feira, 12 de junho de 2009

Eu tenho siringomielia VI


Agora é exercício

A siringomielia nunca foi desculpa pra que eu não pudesse viver. Ao contrário. Mesmo com toda a sua carga, vivi intensamente, no limite da imprudência. Então, não é agora, mesmo com as severas limitações, que deixarei de continuar vivendo. Basta mudar o rumo, embicar o leme pra este lado que aqui também tem vida, num oceano de calmaria.
No meu retorno ao hospital Sarah, no início de 2006, aguçou a curiosidade de encontrar outro/a "malacabado/a" da tribo "siringomieliana". Igual aos andantes em relação a nós, que ficam doidos pra saber o que aconteceu com a gente.
A indagação recorrente:
-Foi acidente?
Pois cheguei a abordar uma companheira, de andar meio parecido com o meu, aqui tá raso, aqui tá fundo, consequência de uma doença que também paralisou os movimentos da sua perna, mas era "falk".
Trocamos impressões, e ela perguntou:
-Ainda faz nheco, nheco?
-Claro - respondi.
-Vida que segue, né, receitou a criatura.
Não é fácil encontrar uma "avis rara" com siringomielia. Continuo procurando.
Costumo dizer que ainda não ganhei na Mega-Sena, mas tenho a "mimi".
De volta à aldeia, depois do check up no Sarah, é hora de tomar tenência e fazer a minha parte. A prescrição médica foi pelo tratamento convencional, nada de medicamentos, apenas exercícios. Optei pela hidroterapia, recurso que julguei capaz de duelar com a "mimi" pra preservar o mínimo de autonomia pessoal. Uma luta diária, em favor da minha independência/individualidade.
Meu primeiro dia na piscina da AABB local, onde faço a hidro, foi marcante. Ela não tem adaptações pra essa demanda. O acesso é precário e nada de barras nas laterais. Pra entrar, sento na borda e pulo na parte rasa.
Pra sair foi o ó do borogodó. Claro que não foi necessário um guindaste ou um caminhão munck, mas tive quer ser içado pela Paula, minha mulher, é pelo Roque, "o faz tudo" da AABB, situação que se repetiu por uns 45 dias.
A sequência nos exercícios, uma bateria de oito, com duração de uma hora, três vezes na semana, surtiu efeito. Com dois meses já conseguia sair da piscina só com a ajuda da Paula. O ganho me animou. Melhorei a escada de acesso e coloquei uma barra na lateral.
Hoje, três anos após iniciar a hidroterapia, não tenho receio em afirmar que a hidro me salvou, preservando uma parte importante da minha autonomia. Mesmo agora, que estou há mais de 25 dias sem exercícios, por causa do frio, - aqui não existe piscina aquecida -, sinto o quanto o meu corpo pede a hidroterapia. Tento compensar com uma caminhada diária, de uma hora. Mas sempre fica faltando alguma coisa.
O ganho com os exercícios é diário e de forma contínua. Não adianta a gente querer projetar resultados pra daqui a dois, dez, cem dias. Ele só vem com a repetição, com a sequência, com o compromisso com você. É viver com atitude. Ninguém salva ninguém.
Daí, cabra, vai de maluco beleza, Raul Seixas, em Tente outra vez:
... levante sua mão sedenta e recomece a andar
não pense que sua cabeça aguenta se você parar
não, não, não............
Não tá satisfeito, tome mais:
... e não diga que a vitória está perdida,
tente
se é de batalhas que se vive a vida...

Por isso não tenho receio em fazer uma mea culpa por antes não ter me dedicado aos exercícios.

O duelo com a siringomielia continua.