segunda-feira, 20 de abril de 2009

Eu tenho siringomielia V


De volta ao Sarah

Siringomielia, siringomielia
Na tristeza e na alegria
Minha fiel companhia
E, assim, siringomielia
Deito, acordo, levanto, caminho
Você não me deixa por um dia
Pois é siringomielia
Quanta surpresa!
Quem diria!
Mesmo com essa pobre rima
Fui capaz de fazer algo que não sei
É poesia?

Siringomielia agora é caso médico.
Decido assumir de vez e fazer o que não tinha feito até então, tratar o problema como ele é, uma doença.
No final de 2005, procurei ajuda ao Hospital Sarah, de Brasília, na condição de ex-paciente e também ancorado no apoio da Rosi, amiga de trabalho da minha passagem por lá. Também empurrado novamente por outra crise infernal na coluna, me deixando torto, empenado e paralisado.
A consulta foi marcada pra fevereiro de 2006. Garibamos o "pretinho", sem adaptação, e com a Paula, rumamos pra Capital Federal, refazendo os cercas de 1.300 km do percurso feito por diversas vezes, em outro tempo. É um caminho conhecido, uma oportunidade pra parar novamente em Três Maria, uma das represas do "Véio Chico" - Rio São Francisco -, comprar o Dourado, assá-lo e comer acompanhado de arroz branco, purê de inhame, com uma colher de sopa de melado, posta no seu centro, cercado por ramos de salsa.
Ficamos cerca de 40 dias em Brasília, fazendo uma bateria de procedimentos médicos, entre exames, consultas e avaliação física motora.
Sobrou tempo pra rever a cidade, inchada na periferia. Voltar a Pirinopólis (GO), na casa da Leda e Zé Antônio, e encontrar a Conceição, Edgar, Oneida, Aroldo e Márcia, o povo de Goiânia.
Além do aspecto pessoal, o retorno foi importante também pra fechar um ciclo de convivência com a "mimi".
Tenho um histórico bem fundamentado da sua evolução. O prontuário está no Sarah. Ele reúne as primeiras imagens da ressonância, investigando a doença, feito 1992, além dos outros exames da minha primeira passagem pelo hospital, em 1996, incluíndo o da marcha. Faço questão de destacá-lo, pois é pra mim, leigo em medicina, a forma concreta de visualizar o estrago da doença, pois permitiu confrontá-lo com o resultado do exame feito nesse retorno. Reitero a negociação que faço pra publicá-lo aqui.
A ressonância mostrou o avanço da doença até a T3 (torácica) - ela tomou de assalto toda cervical.
A novidade ficou por conta do exame de pressão da bexiga. Controlo razoavelmente a urina e o intestino, sem abusar, pois falta mobilidade pra chegar a tempo no banheiro. Não saio de casa sem o ritual matinal e evito tomar muito água. Lá fora é cruel e bom ao mesmo tempo.
Concluído os exames é hora do veredito dos neuros. A seringomielia, mesmo chegado a T3, se estabilizou. A recomendação foi o tratamento convencional. Nada de medicamentos ou intervenção cirúrgica. Apenas acompanhamento médico e exercícios.
Fui encaminhado ao ginásio do lesado medular pra uma avaliação física motora.
De cara, ganhei duas bengalas canadenses, abandonando a que me acompanhou desde 1998, e também liberando o apoio da Paula pra caminhar. Mais autonomia.
Depois passei uma semana na hidroterapia, treinando uma série de oito exercícios, com duração de 40 minutos.
Era a hora de voltar.
Entendi aquele momento, a doença e suas consequências e, principalmente, ter chegado a hora de agir pra não cair de vez, perder toda autonomia, ou me tornar um estorvo.
Questão de consciência e sobrevivência.
Uma coisa é irreversível: A idade reduz nossa força, nosso vigor físico. Não adianta ir contra a natureza das coisas. Portanto é necessário respeito a essa dinâmica. Também não é perder as oportunidades que surgem.
Arrumamos as malas e demos um até breve ao planalto central, rumo ao nível do mar, motivado pelo novo desafio: hidroterapia e retorno anual ao Sarah.

Continua.....

*A siringomielia é uma doença na medula. Ela dilata o canal central, criando uma cavidade que pode prejudicar a circulação do líquor. Ela se desenvolve lenta e progressivamente, afetando membros inferiores e superiores, provocando enrijecimento e perda da sensibilidade, além de dor de cabeça, problemas neurológicos e espasmo. Cada caso é um caso. É rara. Não tem cura. É preciso conviver com ela.
Outras informações no http://siringomielia.blogspot.com, em espanhol.