domingo, 8 de janeiro de 2012

Eu Tenho Siringomielia XIII

Aparando o mato.
Ou como me tornei um soldado de César, o imperador.

E como ele cresceu por aqui. Também a siringomielia continuou o seu avanço silencioso, limitando cada vez mais meus movimentos, agora acrescido de dores por todo o corpo.
São paralelos diferentes.
O mato cresce porque a natureza é sábia na sua reconstrução. Tem a capacidade de ir mudando de fases até voltar a se tornar uma floresta exuberante.
Já a siringomielia vai no sentido inverso, o que é o seu curso normal. Assim são os seres e os organismos vivos de Gaia. Cada um cumprindo o seu papel, por mais paradoxal que isso possa parecer.

No final de novembro de 2010, experimentei um novo revés na convivência com a siringomielia. Fui dormir com o corpo em pleno funcionamento, dentro dos padrões da época. Ao acordar no dia seguinte não acreditei no que estava acontecendo: O meu ombro esquerdo todo inchado, um vermelhão assustador e com o braço travado, sem movimento e dolorido.
-Perdi a minha asa esquerda, pensei.
Era o braço com o qual tocava a minha vida e pra onde tinha transferido grande parte das atividades manuais. As sequelas da "mimi" estão concentradas na perna esquerda e braço direito. O braço direito não está totalmente avariado, me permitindo arriscar algumas coisas que não pedem força, tato, sensibilidade. Forçando até que colabora.
Foi um "toco". O chão escafedeu-se. E agora criatura?
Um turbilhão de indagações permeou meus pensamentos, tentando encontrar uma saída ou uma resposta racional pra aquilo.
Esperei a segunda feira - aconteceu de sexta pra sábado - pra ir ao médico daqui, Marataízes/ES, sem muita estrutura. Depois, mais calmo e já racionalizando aquele acontecimento, fui buscar ajuda em Vitória. Se pretendo continuar mais tempo por aqui, então, é enfrentar mais essa adversidade.
O ortopedista que me atendeu - em 17/12, meu aniversário - foi uma dessas pessoas que são enviadas pra gente. Ele pediu alguns exames e uma consulta a um angiologista.
Aí aconteceu outro fato inesperado. Aguardava na ante-sala pra ser atendido e eis que aparece o Dr. João Sandri, conhecido de Manguinhos/Serra/ES, onde também morei, e não via há mais de 20 anos. Rememoramos diversos fatos daquele período e ele acompanhou a consulta, que ficou como cortesia por esse reencontro.
Saí de lá feliz com o acaso, reanimado e confiante naquela mensagem: Vai continuar vivendo.
Por não ter sido uma queda, o ortopedista descartou a cirurgia. Teria que me ajeitar com a asa esquerda avariada, minha mais nova companheira.
Eu tinha retorno/revisão marcado pra março de 2010, no hospital Sarah/Brasília, onde trato a siringomielia desde 1995. Era a oportunidade pra fazer outra checagem. Confirmaram o diagnóstico inicial: Deslocamento da junção do braço/ombro com desgaste do osso, sem uma causa pré-definida. Podendo ser tanto uma ação conjunta da doença ou sobrecarga no local pelo uso do andador ou outras causas como ficar com o braço pendurando em frente ao computador.
Ou seja, como a "mimi', não me restou muito alternativa. Era conviver com mais esse intruso e continuar assobiando pra vida.
Pra concluir. De soldado de César, paramentado com uma armadura, ou pássaro da asa quebrada, fui readaptando a vida com esta nova perda.
Injustiça? Destino? Sei lá. Estou mais dependente. Preciso de ajuda pra banho, vestir, servir comida, cortar um bife. Continuo dirigindo, passei a usar caneca de alça, como sozinho, teclando, mas reduzi o uso do andador pra não comprometer mais o ombro. Passei a usar um pouco mais a mão direita. A gente vai se readequando às circunstâncias e aos novos tempos. E vivendo. Que é preciso.

PS: Em 2012 "comemoro 20 anos" do diagnóstico da siringomielia.